a mão e o peão.

Wednesday, December 20, 2006

liles

barcelona, 17 de dezembro de 2005 (casa do pêpê e plaça sant jaume)





encontrei-a na agência 117, enrolada num cachecol grosso, cor-de-rosa velho. olhava as prateleiras de roupa com o seu ar atento e distante ao mesmo tempo. já não nos víamos há mais de 9 meses. desde a véspera da minha partida: sentou-se ao meu colo e disse 'tenho de ir-me embora'. abracei-a e perguntei 'importas-te que chore?' (naquele momento quis chorar como um bebé, sem vergonha, chorar e berrar porque me faltaria algo, sem pensar no que pensariam os outros, chorar apenas). e ela chorou comigo. há 9 meses. olhámo-nos como duas pessoas que não se vêem há 9 meses. à procura de alguma diferença gritante, ou simplesmente a apreciarmo-nos. abraçámo-nos e beijámo-nos profusamente. risos tolos. fomos jantar à Cataplana, eu, a lília, a ju e o hugo. arrozinho de polvo e um jarro de tinto da casa. só espero que estes se aguentem cá dentro, pensei (isto, porque passei a noite passada a caminho da casa-de-banho, até me desfazer de todo o jantar na sanita). entre uma piada e outra, a segunda entrevista da miúda que ficou presa 8 anos numa cave e uns pandas quaisquer nos estados unidos. histórias de barcelona. histórias de lisboa, do lux e da faculdade. histórias. uma salinha no maria caxuxa, só para nós. mais histórias e mais festas. um copo de moscatel partido no chão - 'já tinhas acabado de beber, não já?'. saudades que se matam em tempos de silêncios e cumplicidades. a paz de um copo bebido, sentados num sofá, calados ou a rir. um salto ao palpita-me, o bar onde toca aquele gajo da floribella (que, agora, até já tem clube de fãs), simpático e simples. 'tenho de ir, apanhar o último autocarro'. a certeza de um laço, a certeza reconfortante de um laço que os nove meses não apagaram.

Monday, December 18, 2006

música#6

scissor sisters - filthy/gorgeous

excertos

o dia nasceu.
ouvem-se as suas parteiras,
as aves coloridas e histéricas, belas de tanta cor e tanta luz. (um quarto)

beijo as pétalas de uma rosa murcha,
rio com o marulhar do vento nas copas altas,
com o burburinho das águas nos seixos.

transcende-me e assusta-me e atrai-me
o sorriso azul clarinho de uma criança pura... (#3)

vi homens que olhavam o mundo e pasmavam
e outros que o sentiam perdido,
vi ainda quem o quisesse finado, destruído, em chamas
vi quem o amasse com a força de mil vidas
quem o defendesse, quem o violasse,
vi quem nem sequer o sentisse.

vem comigo amanhã encontrar a doçura de um sonho presente
e possível. (hoje andei)

ventos do norte, secos, aziagos
ventos cálidos e lascivos do sul
ventos do mar, cheirando a sardinha e a sargaço
ventos do deserto, trazendo areia e peles morenas
ventos polares, ventos tropicais. (anemofilia)

Cada número é uma vida e cada vida tem um fim
mas esse fim é como o fim do universo que abraço
por não o ter tem-no para mim. (impressões falaciosas de uma noite em que o vento uiva)

distribuir sorrisos como panfletos de campanhas. (peregrinação)

é saudade, um retalho da morte. (saudade)

capatazes vorazes
mandões
patrões
vozeirões
ninguém com um bom par de
razões. (#15)

o caminho vale
pelo que aprendemos e sorrimos
e choramos e partilhamos e ouvimos
e contamos e recebemos e damos e vemos
e sentimos e sofremos e deixamos
e amamos e somos amados... (#20)

veloz sensível em comunhão
cortará as águas desse mar mágico
sussurrando
meu nome é sophia. (a sereia)

quero ser e sentir que sou o mundo nos momentos em que me tens! (#23)

dêem-me vitrais com inscrições dogmáticas!
dêem-me leis, dêem-me normas!
dêem-me mandamentos!
condicionem os meus comportamentos
à exaustão ínfima do suspiro! (#24)

são eternas personagens
de um teatro-vida que escolheram sem querer.

mas o irrevogável teima em não vir.
o irrevogável lhes não há.

amargurados são, de olhar fixo vêm e vão,
aqueles que tudo têm para ser felizes,
mas não o são. (#25)

o céu
o azul marinho que é azul céu no horizonte
gaivotas pérola e amarelo enxofre sol no bico
um peixe dourado apagado areia lençol
alga lenhosa que voa verde
verde pende de uma pena
acena
a porta aberta
revérberos
horizonte

vida que se esvai enfim. (porta aberta)

lençol amarrotado
borra e cinza cigarro apagado
copo de vidro
berço de morte do gelo que no teu peito lambi. (xinstuí amas a vida e eu amo-te a ti)

dar-me-á alguém uma ponte por favor? (#32)

desde a madrugada
em que com uma caixa desesperada de comprimidos me mataste. (o retrato)

no verão
quando a lama ressequida estala e os sapos morrem (#35)

'obrigado pelos seixos que me deste
rolando maciços
ao suave calor de um sol amarelo clarinho

obrigado pelos versos
palavras-poema embebidas em muitos anos
de labirintos possíveis

obrigado pelos sonhos
que prontamente destruíste
nas noites de revelações e utopias

obrigado pelas mãos
pelas rugas e pelo sangue
que incutiste em mim

obrigado pelos caminhos
negros como escadas em caracol
que me levaram ao princípio do que eu era. (obrigado)

o futuro já não vai ser parido. (o aborto)

mas não há escorbuto ou mutismo
que cale o que
eu quero. (#39)

haverá quem me prove
que segundo após segundo
sem cessar
se alimenta o amor
de uma contiguidade exaustiva
e boçal?
(...)
que me perdoem se estou errado
porque
enfim
não sei lá muito disto...
mas
não é amar ser livre? (a falácia dos canibais)

Tuesday, December 12, 2006

em jeito de balanço

a festa de passagem de ano/casi-orgia, em que ninguém se lembrou de contar os segundos finais, no apartamento de pé-direito altíssimo do thieme. viver janeiro (estudar janeiro) a pensar em fevereiro. os mil passeios ao parc güell e a noite das gajas, com aquele casaco branco e felpudo, tipo urso de peluche (perdoem-me, mas não escrevo pelúcia...). quase desfalecer a subir as infernais escadas da sagrada família. o bacalhau à brás da ana, e o italiano estilo george clooney que conheceu no razz matazz. o bar da residência espanhola, fevereiro a decorrer... a sardenha! a noite mais fria e mais desconfortável das nossas vidas, acampados na praia. os pescadores sardos, a fogueira, a aguardente. o ricardo a falar, ininterruptamente. os encontros com a polícia e as mentiras aos seguranças do aeroporto de cagliari, que nos acenaram, simpáticos, um adeus e boa viagem. a rocha rubra, no meio do mar e o bungalow. o desfiladeiro, os perdidos na montanha, o pé na água. o assalto infrutífero às grutas de neptuno. voltar com a garganta apertada. amar a viagem. a eva-maria a ir-se embora, o thieme a ir-se embora, o antoine a ir-se embora, as gurias a irem-se embora. lágrimas e sangria. paris! montmartre que não é nada amélie. nôtre-dame, no meio do rio, bela e sólida. o frio. a neve fininha e o frio. um cocktail fantástico na la concorde, a 2 euros. o meu dia de anos. o peddy-paper, as pistas, os parabéns em 10 línguas diferentes, a nossa teia. a guigui a ir-se embora - acabou. o carnaval de sitges, a última loucura, as perucas, a liberdade total. as lágrimas da leonor e as minhas - já não sabia distingui-las. vir.
achar piada aos eléctricos e à calçada portuguesa, como se fosse um emigrante retornado. os amigos de sempre. alguém no porto. eu no porto com alguém. alguém em lisboa comigo. alguém no porto e eu em lisboa. the end. the flower power party, o regresso em grande. anita e eu, apartados, até 'o tempo que resta'. adorar psicologia sistémica - que núcleo escolho? que núcleo escolho? escolho sistémica. a visita da elsa, encantada com o chapitô, encantada com o portinho da arrábida, encantada com a baixa que brilha mimosa, o sol a atirar-se suavemente, olhos indiscretos na santa justa. o mundial. carros que apitam, pessoas que gritam, bandeiras ao vento. os anos da tripeira, a cachupa no cachupa, rosas e vinho. a vanda, a do sinalzinho, teimosa e encantadora. my angel in love. o legendary tiger man na fnac do chiado. um gajo catalão no lux a dizer que o meu catalão ainda está muito bom. acabou por ir com outro (que era, só, o namorado). a noite mais louca, vozes afinadas no palpita-me, álcool, her coming out story. de puta madre. um engate aqui e ali. o joel, ao computador, a tornar-se um amigo. a entrevista à zé e ao antónio. 42 horas seguidas a trabalhar, sem dormir. para um 17 e meio. convite do alex. dinamarca! o líder. chegar e não entender nada, não saber nada, o pânico. as piadas do ruben, do miguel, da guigui e da ana. a ursha, as eslo-vacas, o chaladão do goran, a sereiazinha. mergulhar no báltico. cantar o 'fly away'. vai ursha, são os teus anos, vamos cantar o rap dos matarruanos. atravessar a ponte e ir à suécia. voltar, os bilhetes do alex no avião pré-escala, a correria até ao avião pós-escala, munique em reboliço. os amigos suíços da pita. as berlengas, nadar nas berlengas. começar a estudar para os exames de setembro. começar a perceber que não se consegue estudar para os exames de setembro. a ju e eu, nas belas artes, a beber água e a rir dos antidemenciais, dos tricíclicos e dos barbitúricos e a perguntarmo-nos como raio pudemos escolher aquela cadeira. a minha aplicação para a islândia, rejeitada. o exame de sistémica, percorrer as perguntas e pensar: não sei responder a uma única. tive 16. começar o novo ano. confusão nas matrículas, como sempre. o olá a bolonha. um baptizado e uma despedida, vanessa em liverpool. concerto da peaches, a loucura com a anita e a diana. suckin' on my titties like you wanted me. ir a coimbra: em lisboa não têm sotaque o caralho! rir e beber cerveja. acordar grog. grog na sé. grog no jardim botânico, grog na quinta das lágrimas. o coração a querer-se-me desprender. acabou por regressar. o aniversário do lux: a noite do ano. ju de lola e eu de javier. os passos de dança, empoleirados na jaula, encontrar a sílvia, vomitar, dormir no carro, à porta. magistral. a joicy, promessa de esperança que se esfumou em três tempos. o trabalho sobre o minuchin, o dia inteiro no técnico. hungria! perdidos na ferrovia, um comboio, dois comboios, três comboios. frau ana kanichen, reatar a amizade de infância, os banhos nos tanques e rirmo-nos estupidamente. não aguentar o tere-boy. carleto cazzeto e straciatella, o jogo da garrafa, dos chochos e linguados, multiculturalmente beijando. o traning course que me ensinou tanta coisa, que me ensinou o que eu quero ser, in a way. budapeste, só com a anita. as escadas da st. stephen's cathedral, o chapéu cor-de-rosa e o arco-íris. voltar, mais trabalho. disputa parental e cineterapia. a casa da ana do cabelo vermelho, os autocolantes da emily the strange e as gatas, enroscadas em mim. o frida, o brokeback mountain e o sixth sense. chorar em todos. barthes&mandrake. o nervosismo que se traduzia em pernas bambas e lábios trémulos. mandrake e a encarregada, tiago e a joana... as palmas, a capa presa na cadeira, a branca do gonçalo. o joel a dançar no frágil, depois de vir, de propósito, de coimbra para ver a peça. o luis, o venezuelano, a dançar no frágil, todo grog com o amigo catalão. a beleza de lisboa através dos seus olhos e a simpatia dos portugueses. saudades das noites no nubaa, deitados a beber um mojito ou uma morangoska. tiago, tío!
2006 revisited.

declaração póstuma

sem querer ser repetitivo, mas já o sendo, obrigado a todos os que foram assistir a 'barthes&mandrake: fragmentos do discurso amoroso» (título renovado), por terem ido e pelas maravilhosas críticas e os dilatadores de ego, sempre bem-vindos.
esta peça, foi aquela na qual eu mais pus à prova as minhas capacidades interpretativas. não só porque era a personagem principal, como porque os cambiantes e as camadas do mandrake obrigavam a uma constante revisão das intenções e das sensações. foi maravilhoso contracenar com a joana cruz, uma grande promessa: creio que a química entre mandrake e a encarregada perpassou para o público, para todo o auditório, insinuantemente. como é natural, isto deveu-se, não só à força interpretativa dos referidos, como ao imenso sex-appeal que é seu apanágio (ehehe). a minha sede de poder, a minha ambição eram verdadeiras, aquele auditório/arquivo tinha de ser meu. e foi. meu e nosso. ultimActo olé olé. até ao FATAL.

lisboetas

descrevendo-o exaustivamente, o dia estava uma merda. anaïs insistira em levar os sapatos pretos, de salto alto. aqueles que estreara no lux e acabaram a noite a ser lambidos por um gajo fetichista, que, além disso, era giro. esses mesmos.
agora, pela hora do almoço, as pastas firmemente encaixadas entre o antebraço esquerdo e o seio do mesmo lado, dir-se-iam aconchegadas, andava o mais depressa que podia (ou corria o mais devagar que conseguia), em direcção ao metro. vou entrar no metro. sinais sonoros. vou esgueirar-me pela fresta. sinais sonoros. merda.
esperar pelo próximo. do outro lado da linha, duas pessoas esperam, também. não simetricamente na plataforma, assemelham-se a peões que ali foram colocados ao acaso, ou jogados fora. não lêem o jornal, não falam ao telemóvel: sentados hirtos, nos bancos do rato.