a mão e o peão.

Wednesday, September 20, 2006

número 26

falaste três horas, sem parar. fizeste-me uma pergunta. somente, uma pergunta. eu, pouco mais disse que expressões aprovadoras do que contavas, uns hum hum, sumidos, uns sorrisos nas alturas certas, quando fui educado o suficiente para o conseguir. contaste estórias que tão longe estão do meu mundo, tão ao lado passam da maneira como vejo o mundo, como me relaciono com ele, da minha constelação de significados. é interessante apercebermo-nos de como essa constelação difere, de um para outro, de como algo tão importante para mim possa ser supérfluo, ou mesmo, indiferente, para ti, para ele. de como a violência, por exemplo, parecia fazer parte da tua vida e de como, só muito remotamente, fez parte da minha. de como atestavas o que dizias com uma veemência típica daqueles que ponderam apenas uma perspectiva para as situações em que se encontram - a sua própria. como raramente sorrias, ou me olhavas nos olhos. a meio do encontro, já havia percebido que aquele seria o primeiro e o último, tão diferente de ti me sentia. mas persisti, não quis ser desagradável, despachar-te de maneira óbvia. faço sempre tudo de maneira a que gostem de mim o mais possível: é capaz de ser o meu pior defeito. de qualquer maneira, enquanto falavas, momentos houve em que não te prestava grande atenção. olhava-te e tentava perceber o que em ti havia que me fizera perder o interesse. cientificamente, tanto quanto poderia. eu gosto de pessoas que falem muito. aliás, muitos dos meus melhores amigos são pessoas extrovertidas, quando não fala-baratos, manipuladores de conversas (esta é para ti...:p)! no entanto, todos eles sabem ouvir. regulam o seu discurso à receptividade do outro, aos sinais que lhes são dispensados, são sensíveis ao feedback. tu não és, ou não foste. pela maneira como defendeste tudo o que disseste que a ti se referisse, e por isto, apercebi-me que só podias ser bastante egocêntrico. e, como o meu ego não é nulo, ou sedento de se colar a outro para se afirmar, não há paciência para pessoas egocêntricas!! ainda disseste, quando apressei a hora de um encontro com uma amiga para me descartar, de fininho, que mal falara, que era muito calado. eu repliquei que tu eras muito «comunicativo»: tentei dar um tom irónico à palavra, mas acho que não fui muito bem-sucedido. disseste que tentaras preencher os silêncios, que foras sempre tu a quebrá-los. ora aí está a prova de dois mundos de significados diferentes. resolvias quebrar os silêncios, mas, nunca, com perguntas. se quisesses realmente que falasse, tê-lo-ias feito, pergunto-me. ou terias receio que não quisesse falar? que estivesse demasiado envergonhado? não fora ter-te dito que não fazia grande sentido continuarmos a falar, perguntar-te-ia, provavelmente, para afastar ainda mais uns metros os nossos mundos. ou, quem sabe...

mas, também, a quem é que isto interessa?

2 Comments:

Blogger Marlene said...

Interessa-me a mim!A tua vida interessa-me sempre, mesmo quando "manipulo" as conversas... :p

E agora, como diria a nossa habitual Mente Assumida, BEIJINHAS!! :)

September 20, 2006  
Anonymous Anonymous said...

a mim também, a mim também

September 20, 2006  

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